Psicodélico, mas sobretudo dançante
Por Luiz Athayde
Os ventos desérticos acabaram de revelar o mais novo trabalho do Mdou Moctar, alcunha artística do vocalista, guitarrista e compositor nigerense Mahamadou Souleymane.
Mas não se trata exatamente de um voo solo. Pelo contrário: Ahmoudou Madassane (guitarra), Michael Coltun (baixo) e Souleymane Ibrahim (bateria) compõem o time que assinou Afrique Victime, editado pelo carimbo Matador Records.
Citando os seminais Tinariwen como exemplo, esta formação compartilha do mesmo cenário de bandas que possuem as mesmas raízes do que depois viria ser chamado de blues, e influências digamos, mais ocidentais, como a psicodelia, sob suas infinitas possibilidades. A diferença básica, se é que isso existe, está apenas na geografia; um veio do Mali, enquanto estes são os vizinhos do Níger, país mais ao centro da África do Norte.
Sua discografia é curta, praticamente homogênea, e também por isso, assertiva. As mudanças em relação ao seu antecessor, Ilana: The Creator, de 2019 se encontram apenas no grau de hipnose que o ouvinte estiver; ainda psicodélico, mas sobretudo dançante.
“Chismiten” não abre por acaso. Essa já te chama para uma pista de chão batido no meio da noite, regada a muito chá e tajín – guisado de legumes com carne. Ou a maravilhosa faixa título, extremamente melódica e envolvente, que traduz com exatidão o que foi descrito.
Obviamente o protagonismo percussivo se mantém intacto, independente do caminho seguido, e um dos destaques é “Bismilahi Atagah”, com ar sublime de canto religioso, mas não de forma dogmática, e sim de celebração.
E por falar em batucada, impossível não bater palmas junto com “Ya Habibti”. A sincronia com o riff pegajoso de guitarra e a maneira que Moctar entoa as letras é definitivamente uma das marcas registradas de um gênero musical que, antes tarde do que nunca, o ocidente enfim, começa a tomar gosto e conhecimento.
E isso se deve a forma sucinta Afrique Victime chega ao universo sônico; como um álbum de músicas curtas, diretas, mas com um grau de profundidade tão extenso quanto o Saara. Mais que um belo disco, estamos diante de um dos melhores de 2021.
Ouça na íntegra pelo Spotify.
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