Projeto do multi-instrumentista norueguês Pete Johansen migra para o experimentalismo movido por pegadas jazzísticas
Por Luiz Athayde
É do profundo subterrâneo norueguês que vem mais um lançamento para a pandêmica classe de 2020: The Scarr.
Primeiramente, faz-se necessária algumas informações para o melhor entendimento. A banda foi formada em 2001 na pequena, mas efervescente cena do Gothic/Doom Metal, centrada no condado de Rogaland, com Theatre of Tragedy, Tristania, The Sins of Thy Beloved e outros.
O capitão? O violinista Pete Johansen, que inclusive foi peça fundamental naquele cenário, já que além das duas últimas citadas, seu talento está registrado em muitos outros discos da esfera metálica de orientação mais, digamos, extrema.
Ainda assim, The Scarr é algo sui generis no meio daquele balaio. Seus dois primeiros álbuns, Animalenemy (2013) e Bastard Music (2014) possuem aquela fórmula que rendeu uma quantidade equivalente aos Gremlins nos dois filmes, mas abraçando outras influências, sobretudo mais progressivas – e traços aqui e ali de Björk e nuances experimentais.
E agora, como parece ser algo da cultura musical norueguesa – ou seja, o fator surpresa – a banda chega com o erudito, eletrônico, jazzy e ainda mais experimental Future Noize.
Embora tenha demorado 6 anos, o registro encerra a trilogia que leva o nome do projeto (The Scarr) e de uma forma que só Johansen para fazer. Pudera: suas influências vão do punk (mais como atitude) à música clássica, de Frank Zappa a… bom, só daí você já pode incluir a palavra diversidade nas 7 faixas do álbum.
“Szandor” abre como se estivéssemos em um drama estrelado por Luv Ullmann, com a história prestes a desembolar diretamente de um quarto cinzento.
“Evil Fucking Bitch” vem logo atrás com um suposto clima zoeiro, mas em menos de 2 minutos a mesma toma a citada via jazzística/experimental; algo como uma ressaca em um dos piores cabarés da cidade.
O porre de vodka continua com “No More Love”. Aqui Nick Cave e Leonard Cohen fazem um encontro que não traria muitas lembranças no dia seguinte, já que a noite foi para lá de etílica. O tom de voz de Pete ao longo do andamento só endossa o teor alcoólico da faixa.
“Not One of You” traz uma introdução misteriosa, com algumas viagens eletrônicas, mas ainda puxando para o jazz. Dark jazz. Uma paixão local, inclusive. Em “Doctor” Johansen arrisca até um rap tão torto que chega a soar hilário, mas por incrível que pareça, rendeu um resultado bem legal. Proibido para ouvidos convencionais…
Quando você começa a adentrar no universo (e na proposta) do disco, o mesmo já está chegando ao fim. “The One I Never Was” soa um tanto fantasmagórica, mas sobretudo guiada por um clima de jam sem hora para acabar. Uma espécie de bad “trip” sônica, mas sem o “hop” de um ou Portishead ou Massive Attack.
O fim da linha se dá com “Dead People”. Delírio pesado, com risadas assustadoras e ruídos etéreos entrelaçados a uma bateria guiada pelo seu próprio tempo. Como se não bastasse, o violino acrescenta um tom ainda mais agonizante. Interessante sim, mas para poucos; ou tão loucos quanto.
Por outro lado, Future Noize é o resultado esperado de um artista aficionado por música fora do padrão e anos-luz do mainstream, ou seja, tão peculiar quanto sua abordagem, mas digna de uma honestidade fora de série. Bem estranho, e por isso mesmo, muito bom.
Ouça o álbum completo no Spotify: