Formação italiana intensificou o lado improvisador do jazz
Por Luiz Athayde
Sabe aquele vizinho de quintal que insiste em fazer barulho, seja ele qual for, por 15, 16 horas por dia? Então, essa é a sensação que EEEEELS, novo álbum do DOORTRI pode passar se você estiver na espera de algo como a nova música da maravilhosa Adele.
Agora, caso sofra de algum transtorno neurológico, vai que rola um choque do naipe “menos com menos é mais” e surge uma melhora?
Divagações doentias à parte, o fato é que a trinca Tiziano Pellizzari (sax, baixo, clarinete, eletrônicos), Giampaolo Mattiello (bateria) e Geoffrey Copplestone (synths, vocal) não é lá chegada a limites quando o assunto envolve emitir sons.
E se render música, bom. Se não, o que importa é o processo de compor climas e paisagens abstratas. Aquele dadaísmo nosso, ou melhor, deles, de cada dia.
As 12 faixas do sucessor do desafiador PFAS OFF (2023) conseguem te levar a lugares ainda mais estranhos. Entre eles, porões, fábricas desativadas e até para o espaço, dependendo do seu grau de sanidade.
Todavia, tantas colagens e devaneios sônicos tinham que vir de algum lugar. E veio: de influências predominantemente germânicas; Faust, Neu!, Einstürzende Neubauten, mas também David Bowie, Frank Zappa, Killing Joke, John Coltrane e Suicide.
Importante ressaltar que não se trata daquele típico registro onde você naturalmente se depara com a melhor canção, o ponto alto. O lance é apertar o play, ouvir inteiro e absorver o que for possível durante sua estadia no mundo destes italianos de Vicenza.
Ainda assim, destaco a faixa-título (a do vizinho), por sacanearem maravilhosamente os temas hollywoodianos de ação policial. Outra sensacional (não sei se é bem esse o adjetivo, mas ok) é “Shumiki, Shumy, Shumischi”; uma espécie de ode a um monstro arrastando o lixo para fora.
Se bem que “Jelly Belly” com seu mix de rap e música árabe à la Fun-Da-Mental (de Aki Nawaz, do Southern Death Cult) é nada menos que fantástica. No entanto, “Sleeeee” carimba seu passaporte para um mundo pós-apocalíptico – que sabemos não estar muito distante.
Bom, o quadro é esse. Ah, por falar nisso… a arte de Stefano Zattera para a capa já figura uma espécie de spoiler do disco: o polvo sem o menor medo de tomar choque ao capturar as enguias à sua frente. É o destemido DOORTRI após sessões de experimentações e viagens sem destino (e resultado) final.
Ouça o álbum na íntegra pelo Bandcamp, ou a seguir.