Era o começo dos flertes cinematográficos dos irlandeses
Por Luiz Athayde
Por muito pouco não fiz uma lista de “melhores discos” deste gênero musical tão linear no que diz respeito à sua posição no voraz mercado musical: Ambient Music.
Mas seria de uma injustiça sem precedentes, já que, por haver inúmeros atos dignos de nota, para dizer o mínimo, e até mesmo para jogar outros na roda em um futuro próximo, irei me ater a esse que é um dos lançamentos mais significativos.
De um modo geral, ao menos em Terra Brasilis, quem ouviu falar de Clannad costuma se referir como a antiga banda de Eithne Pádraigín Ní Bhraonáin, mais conhecida como Enya.
Mas esta falange celta possui um histórico tão grande que a participação de Eithne foi apenas uma fração na linha do tempo do grupo formado em Gwedore, Irlanda, em 1970.
Composto por Moya Brennan (vocais, harpa, teclados), Ciarán Brennan (baixo, mandolin, vocais), Pól Brennan (flauta, guitarra, percussão), Noel Duggan (guitarra, vocais) e Pádraig Duggan (guitarra, mandolin, vocais – 23/01/1949-10/08/2016), a banda lançou, entre 1973 e 1987 uma bateria de álbuns naturalmente calcados na música celta; passando do rock “quase” progressivo à gradativas inclinações gráficas para o pop, ou charmosamente conhecido como Adult Contemporary.
Se sua era inicial nos remete a nomes como o clássico Renaissance e a lendária Joni Mitchell, na década de 80 o grupo alcançaria seu sucesso comercial através do álbum Magical Ring, lançado em 1983 pelo mega carimbo RCA. O single “Theme from Harry’s Game”, lançado no ano anterior, ajudou a garantir o êxito do disco, até hoje um dos clássicos da banda.
O ponto, digamos, de virada para o pop veio em 1987, com o álbum Sirius – que inclusive merecia um texto à parte devido as participações no registro –, servindo de porta de entrada para o mergulho do grupo no universo das trilhas sonoras. E é aí que entra Atlantic Realm.
Lançado em 1989, o disco foi gravado no Windmill Lane Studios, em Dublin, Irlanda, e contou com produção assinada por Pól e Ciarán Brennan.
Embora distante da sonoridade folk dos álbuns prévios, a aura viajante se manteve intacta. Na verdade, este é um dos discos em que o casamento música + imagem mais deu certo; vide o propósito do qual o mesmo serviu. Sua música foi o pano de fundo para série da BBC The Natural World: Atlantic Realm, um documentário sobre o Oceano Atlântico.
Como toda trilha, as faixas são intituladas baseadas nas cenas/episódios do vídeo, como “Signs of Life”, “Moving Thru”, “Predator” e “Children of the Sea”, dois dos grandes momentos do registro, diga-se.
Aquática, densa, atmosférica e, ao mesmo tempo melodiosa, a música deste período específico do Clannad lhe traz na mente todas as imagens possíveis de um mundo inóspito e ainda intocado pelo homem.
Se há algum poder de convencimento aqui, digo que você precisa ouvir Atlantic Realm por ser um álbum de muitas possibilidades; todas envolvendo baixar a bola em momentos de profundo estresse em um mundo líquido, no pior dos sentidos.
Atlantic Info:
+ Os caminhos etéreos seguidos pelos irlandeses ainda renderam pelo menos mais dois álbuns: ‘The Angel and the Soldier Boy’, trilha sonora da animação homônima de 1990, e o folk e climático ‘Anam’, de 1991.
+ Outras assinaturas em trilhas incluem filmes como ‘Coração Valente’ (“Croí Cróga”) e ‘O Último dos Moicanos’ (“I Will Find You”).
+ Enya integrou o Clannad entre 1980 e 1982, como tecladista e backing vocals, e gravou os álbuns ‘Crann Ull’ e ‘Fuaim’.
+ Em 1996 a BMG e a RCA relançaram Atlantic Realm em CD; remasterizado e contando com outra capa, um castelo à beira mar.
Ouça Atlantic Realm na íntegra a seguir.