Primeiro álbum em 22 anos mostra a beleza singular do pop escandinavo
Por Luiz Athayde
Quando se fala em pop norueguês logo vem à mente o A-ha. E não é pra menos: até hoje, Morten Harket e cia fazem grande sucesso em terras brasileiras. Só que, o lance por aqui é sobre um nome de menor projeção, mas não menos criativo. E ainda mais amplo: Bel Canto.
Sua discografia é curta, porém, extremamente consistente. Destaque para seus dois primeiros álbuns, White-Out Conditions (1987) e Birds of Passage (1989).
No Brasil, ambos são conhecidos estritamente no meio gótico; embora Anneli Drecker, Nils Johansen e Geir Jenssen nunca fossem trevosos. Cortesia da sonoridade dos registros citados, ao flertar com o que o Cocteau Twins e correligionários do selo 4AD fizeram anos antes.
Os dias passaram, Jenssen partiu para um caminho mais experimentalista com seu projeto Biosphere e o céu musical continuou sendo o limite para o duo remanescente. Ao menos até 2002, quando editaram Dorothy’s Victory.
No entanto, eis que o duo chega a 2024 com um álbum novo em folha, curiosamente lançado por carimbo independente.
Radiant Green está longe de ser um retorno às raízes, mas apresenta sinais sutis e assertivos com os dias de outrora. A começar pela mixagem, assinada por Gilles Martin (Tuxedomoon, Front 242) e Matias Tellez.
Martin produziu os discos “White- Out…”, “Birds…” e Shimmering, Warm & Bright, de 1992. Sem mencionar a reaparição de Geir Jenssen, co-autor em duas das dez faixas presentes no álbum.
Boa parte delas traz o dreampop como força motriz. Ou, é apenas a forma mais fácil que encontrei de etiquetar o som, já que as nuances passam por downtempo, ethereal wave e synthpop.
O melhor exemplo (e não faixa) é o carro-chefe, “Grass Mint Crisp”, onde não somente mostra tais referências, como aponta o de sempre: olhar contínuo e adiante.
Aquele papo de ponto alto é praticamente inevitável logo na subsequente “Erlkönig”. Música pulsante, com um poder de envolvência fora de série. De alguma forma, lembra coisas antigas da artista sueca Fever Ray, inclusive no jeito de Drecker cantar.
Por falar em eras passadas, “Lifeworld” faz um crossover entre a aura dos primeiros álbuns e o agora. Mais importante que isso, ela possui grande refrão de pegada celestial, como a ótima “Prince Of Insecuria”.
Em contrapartida, “Train Window Girl” acena lindamente para o jazz. Como se Billie Holiday encontrasse uns sintetizadores congelados nos arredores de Tromsø. Faixa mais cinematográfica do disco, diga-se.
Já “Virginia” revive a formação original ao trazer a colaboração de Geir Jenssen tanto na composição quanto no trabalho de produção. Sim, é outro pico no gráfico das melhores músicas do registro. Neste caso, Anneli Drecker faz um belo dueto com o cantor e compositor norueguês Sondre Lerche.
“Lake Ice”, também com seu antigo companheiro de banda, figurou um dos singles que anteciparam Radiant Green, e soa exatamente como uma “faixa 7”. Tipo, muito boa, mas há músicas melhores.
Diferente de “Can Of Worms”, que lança mão de melodias setentistas para soar ainda mais atual. Não bastasse isso, o fade in da instrumental “The Winds Of The Milky Way” chega para hipnotizar de vez o ouvinte, especialmente pela notável influência progressiva.
Não fosse pelo nome da banda, diria que “Wave Without A Shore” se trata de uma música do grupo dinamarquês Bliss.
Contudo, é apenas Bel Canto no jeito único das formações escandinavas de entrelaçar sonoridades e ainda soar sofisticada. Tudo bem que não bate de frente com o seminal Birds of Passage (1989), porém, é tranquilamente um dos melhores momentos da carreira. Discaço.
Ouça Radiant Green na íntegra a seguir.