Shoegaze, dreampop, pós-punk e maturidade em novo trabalho discográfico da formação texana
Por Luiz Athayde
Neste exato momento em que você lê esta resenha, a banda Blushing está em algum palco da vida, despejando carregadas doses de barulho sob intermináveis camadas melódicas. O pessoal de Austin, Texas, Estados Unidos, divulga seu mais novo disco de estúdio, o primeiro editado pelo carimbo Kanine Records: Possessions.
O sucessor do autointitulado álbum de estreia de 2019 veio naturalmente com mais força e maturidade. Também, pudera: as composições assinadas por Christina Carmona (baixo, voz), Noe Carmona (guitarra), Michelle Soto (guitarra) e Jake Soto (bateria) tiveram o toque de Mark Gardener, vocalista e guitarrista do Ride, na masterização. Não bastasse isso, um dos aperitivos, o single “Blame”, conta com a participação da musa shoegazer Miki Berenyi, do Lush e Piroshka.
Só daí já é possível visualizar o prisma do qual o grupo se guia. Acrescente também, doses homeopáticas de pós-punk para dar aquele toque mais que certeiro em alguns momentos ao longo das 12 faixas, que inclusive se gladiam para ver qual é a melhor.
Sim, é difícil mesmo. E a mágica está justamente neste ponto. “Bed” abre o registro com uma pegada quase gótica, acrescentada pelos vocais angelicais de Christina, desafiando o ouvinte a seguir com a jornada. “Sour Punch” foi outra música de trabalho a tomar as plataformas digitais antes do lançamento do disco. Essa mira claramente no final na era discográfica da ex-banda de Berenyi – que muitos aficionados em shoegaze torcem para um retorno.
Já “Ours” tem aquela abordagem praticamente impossível de passar batida pelos ouvidos; guitarras “chuva fina,vento frio” estilo Cocteau Twins e o dinamismo típico do Lush. Possível pico gráfico aqui. Em “Surround (With Love)” a linha temporal se mantém fiel aos anos 90. Embora já comece em uma envolvente camada etérea, a música desbanca, no melhor dos sentidos, para um noise rock cheio de energia. Fuzz reinando mesmo.
Mais um momento sublime no registro. Agora proporcionado pela “Gel”. A fórmula aqui é amplamente conhecida por nomes como Slowdive e Chapterhouse, mas felizmente nunca fica batida. Extremamente cativante. “The Fires” aparece logo em seguida, e devo dizer que se tivessem colocado mais reverb, poderia muito bem caber em algum momento de Head Over Heels, clássico álbum de 1983 dos Twins.
Como um bom disco de rock alternativo da atualidade, ou seja, extraindo o que de melhor os seminais fizeram, a faixa-título chega para cumprir esse papel, de forma direta e sem enfeites, exceto pelas necessárias pedaleiras de guitarra. Provavelmente sem a menor intenção, “Waster” soa como Bethany Curve ou mesmo o que o Skywave fez, mas com uma produção superior. Vale lembrar que as temperaturas continuam baixas…
“Lost Cast” ameaça a veia retilínea de “Possessions”, se diferenciando ao apelar graciosamente para o shoegaze/dreampop em seu desfecho. Por outro lado, “Weight” é mais cadenciada, viajante, quase ‘Cureana’, em clima de fim de disco. “How It Ends” está mais para faixa 2 do que para encerramento, mas a ideia foi essa: terminar do jeito que começou; com vigor e poder de persuasão.
Possessions é o tipo de álbum que agrada em cheio porque seus criadores seguiram com exatidão esta parte da cartilha alternativa: o shoegaze associado ao dreampop. Além de nuances melhor absorvidas quando escutadas duas, três, mais vezes. E cá entre nós, dessa forma acaba sendo muito mais prazerosa. Que banda.
Ouça o álbum a íntegra abaixo.
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