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Tulus – Fandens Kall

Trio mais descompromissado do black metal norueguês segue cru, ríspido e rock and roll

Por Luiz Athayde

A banda norueguesa de black metal Tulus é quase um ponto cego na cena escandinava. Formada em Oslo, na classe de 1991, ou seja, em plena efervescência do estilo, ela sempre esteve ativa, mas nem todos conseguiam visualizá-la.

Tulus (Foto: Morten Syreng)

Entre demos e dois álbuns consistentes e singulares nesta esfera – ‘Pure Black Enery’ (1996) e ‘Mysterion’ (1998) –, seu aparente auge criativo se deu com o fantástico Evil 1999, lançado no ano epônimo.

De lá para cá, o panorama da música extrema do país se dividiu entre os bem-sucedidos comercialmente, e os que se mantiveram fiéis ao lado mais cru, ríspido e afrontador do gênero.

Bom, é evidente que eu estou citando o trio formado pelos velhos de guerra, Blodstrup (vocal, guitarra) e Sarke (bateria); mais Crowbel (baixo), desde 2008 integrado ao grupo. E, há pouco, saiu o seu sétimo álbum de estúdio via carimbo Soulseller Records, intitulado Fanders Kall.

A linha temporal em relação a seu melhor momento (1999) é grande, mas os resultados subsequentes são, sem sombra de dúvidas, igualmente louváveis. Old Old Death, de 2020, foi o último registro da banda, e de certa forma é dali que eles continuaram musicalmente, ainda que ao longo das 10 faixas há de se encontrar elementos de álbuns anteriores.

Lars Erik Westby assina a produção, mixagem e faz uma ponta tocando piano, enquanto Thomas Ebergeer cuidou da masterização, no estúdio Stockholm Mastering. Por último e não menos importante, o disco ainda reprisa a participação da cantora Lena Fløitmoe, conhecida de longa data dos caras.

A faixa-título foi a escolhida para abrir o play. Logo de cara, conexão direta com o áureo fim dos anos 90. Toda a atmosfera sombria está ali; desde o riff tipicamente norueguês – não é poesia, eles realmente reinventaram o estilo – à rapidez. Entretanto, “Lek” poderia ter figurado com facilidade uma entressafra de Olm og bitter (2012) e “Old…”

Já “Slagmark” traz uma das marcas da banda: a cadência. De um lado, Sarke dita as regras com sua bateria minimalista, mas extremamente rock and roll, e do outro, o restante da cozinha se mostra livre para ‘quebrar’ o som em meio a um clima fúnebre. Sempre.

“Allstøtt” também pode ser chamada de ‘túnel do tempo’, tendo em vista seu andamento à la “Salme”, só que mais acelerado. “Isråk” vem na sequência como a mais rocker do disco, com um ritmo realmente contagiante. Esta sabiamente foi o single debut quando o trio anunciou o lançamento do álbum.

Logo depois surge uma introdução acústica, que inicialemtne não se sabe se é um interlúdio ou alguma pisada no freio. “Samuelsbrenna” é quase ambos, mas se destaca devido ao apelo do baixo em seu andamento. Isso quando o violão não acentua o agonizante clima de suspense na faixa. De alguma maneira, o Black Sabbath nunca deixou de ser um norte.


Falando neles, é bom avisar que “Sjelesmerte” não é nenhuma ‘Children of the Grave’, mas sua pegada setentista envolve do mesmo jeito. Aliás, se Ozzy soasse black metal, acredito que seria assim. É também aqui que Lena Fløitmoe aparece com sua voz, por sinal, bem fantasmagórica.

Voltando às faixas velozes, “Bloddråpesvermer” dá conta do recado ao impedir o ouvinte de se deparar com um registro totalmente soturno – embora fosse uma excelente ideia. E “Snømyrkre”, o segundo aperitivo do álbum, apela para aquele rock mais, com o perdão da redundância, pedregoso, realmente pra frente. Ponto alto à vista. Mas para encerrar, “Barfrost” cumpre seu papel num belo formato folk, acústico e, ainda assim, gélido.

No fim das contas, o lance é sobre honestidade. De uma banda que há mais de 30 anos levanta a bandeira da (sua própria) independência, através de músicas apontadas para o lado oposto do mercado. Em contrapartida, black metal não é mais um bicho de sete cabeças como antigamente. E qualquer abordagem nos dias de hoje será melhor aceita.

Fandens Kall mostra o Tulus coeso de sempre, com seu usual primor melódico e atmosférico, e, como há alguns discos, simulando corpse paint em nomes como AC/DC e Motörhead em suas composições. São essas características que fazem deles a banda mais singular do perímetro norueguês, também ao provar que menos pode ser muito, muito mais. Recomendo de olhos fechados.

Ainda:

+ A preocupação com a arte sempre foi um ponto importante nos álbuns do Tulus. E a bela capa é assinada por Kjell Åge Meland (Sarke, Horizon Blaze, Veil of Secrets)

Ouça Fandens Kall na íntegra pelo Spotify:

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