Joia do underground sombrio brasileiro se destaca pela produção nas suas canções extremamente envolventes
Por Luiz Athayde
O surgimento do duo Lost Lenore foi um dos momentos mais aliviantes da pandemia de Covid-19. Entre os motivos está a geografia: Região Norte do Brasil. Distante das “capitais”, mas promissor.
Tudo começa quando a musicista roraimense Bianka Tarolla é vista pelo produtor amazonense Augusto Batcave (Misfortune Deep) através de um vídeo enviado por um amigo em comum. Dali, o passo foi o nome, extraído do conto homônimo de Edgar Allan Poe. E claro, músicas. “Medo” marcou a estreia, sendo um ano depois seguida da viciante “Desmorto”.
Mal sabia este que ambas fariam parte do álbum de estreia, Incólumes, editado em fevereiro desse ano pelo carimbo independente Systemica Records, de São Paulo. Seu viés synthpop/italo disco era a deixa para o direcionamento musical presente.
Além dessa, o registro traz seis faixas executadas por Augusto, Bianca e Gabriel Pelenson; este, responsável pela produção, mixagem e masterização. Ah, ele também é o dono do selo paulistano acima citado.
Parceria melhor que essa no perímetro nacional não há. Especialmente por se tratar de sangue novo. Aliás, melhor: que sabe exatamente o que está fazendo.
Ainda que novo, pode-se dizer que Gabriel é um especialista em criar ambiências nostálgicas, mas sobretudo cativantes. E contar com a sinergia causada pela química entre os dois artistas.
Basta apertar o play na instrumental “Prefácio” que a viagem começa. “Retalhos” vem na sequência para sublinhar a proposta lírica do duo, calcado na exposição de sentimentos internos.
A faixa-título é outra fora de série. Ela endossa a veia da nostalgia sob um fantástico manto de synth e darkwave. Nessa rola umas conexões involuntárias com nomes como Starforce e Jean-Michel Jarre.
Por outro lado, “Abandono” chega a assustar de tão oitentista. Se feita naquele período, certamente figuraria a mesma galeria de 7 polegadas lançados na classe de 1986. Como “Imagination”, da dupla alemã Avenue.
“Desespero” saiu como terceiro single antes do disco vir à tona e, curiosamente, aqui soa quase como um (excelente) coadjuvante. O que é uma grande ironia ao ouvir o álbum na íntegra.
Sem mencionar o título, tendo em vista que a única coisa impossível no álbum é justamente passar incólume; por suas composições e o trabalho assertivo na produção. Além de ser um presente para saudosistas de plantão.
Uma pena essa joia sônica perigar cair no ostracismo caso seu trabalho de divulgação continue tão silencioso quanto suas redes sociais. Há muita coisa boa saindo no subterrâneo nacional, mas nem todas de causar tamanho impacto na experiência da audição como Incólumes. Discaço.
Ouça na íntegra a seguir:
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