Às vezes, tudo que precisamos é um disco de rock básico e cheio de feeling
Por Luiz Athayde
O choro é livre para quem odeia Oasis e ainda sente falta do Stone Roses – meu caso, inclusive; a reunião durou muito pouco.
No entanto, isso não é motivo para eclipsar um dos álbuns mais sensacionais lançados neste ano: o autointitulado de Liam Gallagher & John Squire.
Só pelo cacife de ambos e por virem de Manchester, a certeza de um grande disco era iminente. E aconteceu do jeito mais simples possível: através do carisma de Gallagher e o talento (injustiçado, diga-se) de Squire para compor. Resultado: dez faixas seladas no blues rock, na neopsicodelia e no britpop.
Claro que dá para fazer referências aos Roses, especialmente no álbum de estreia. Assim como a crueza de Definitely Maybe, que surge ora disfarçada de Jimi Hendrix, ora de Beatles e Yardbirds.
“Foi muito inspirador ter aqueles shows de Knebworth frescos em minha mente quando comecei a compor” disse Squire à New Music Express sobre o álbum.
Ele se refere a sua participação no show de retorno de Liam no Knebworth Park, na Inglaterra, lugar onde o Oasis fez história em 1996 com duas apresentações bíblicas.
“Depois, foi uma questão de tentar evitar que tudo ficasse muito roqueiro e tentar mesclar os sentimentos também”, concluiu.
Bastam apenas segundos de play para constatar que se trata de um registro sóbrio, de gente que está nesse jogo há longos, longos anos. “Raise Your Hands” é autoexplicativa, porém, não te induz apenas a levantar as mãos; ela é extremamente dançante. Single nato.
“Mars to Liverpool” também figurou música de trabalho por motivos óbvios. Pegada para lá de Rolling Stones e um refrão pegajoso. Coisa que também rola na faixa seguinte, “One Day At A Time”. Melhor não há.
Em “I’m A Wheel”, a abordagem é sutilmente eletrônica, remetendo anos-luz ao Depeche Mode em Delta Machine (2013). É que o denominador comum de ambos tem etiqueta: blues.
Agora, a mais Stone Roses do álbum é, sem dúvidas, “Just Another Rainbow” (mais um single). E está tudo em casa se conectá-la a “Waterfall”, afinal o compositor é o mesmo. A diferença é que John deixou, como ele chegou a dizer em entrevistas, a música fluir, e não seu lado guitarrista.
Isso muda rapidamente com “Love You Forever”; Hendrix encontra Lennon no que poderia ter sido outra colaboração de peso se os dois tivessem vivido mais. “Make It Up As You Go Along” vai à inglesa; rock dos anos 60 como se feito na década de 90. Também há algo de The Seahorses ali, banda muito bacana formada por John após a primeira ruptura dos Roses.
Em contrapartida, “You’re Not The Only One” endossa a parte rockeira citada por Squire. Seu groove é o ponto alto da canção.
Logo em seguida surge “I’m So Bored”, que mais parece uma música feita de supetão. Tipo John Squire acordando, pegando a guitarra e compondo em dois tempos. Nem preciso dizer que essa é a mais direta do debut.
Os pés pisam com calma no freio na bela “Mother Nature’s Song”, música com cara de “até breve” e não uma colaboração para deixar de escanteio. Inclusive, Liam chegou a dizer que “seria rude não fazer outro álbum” com John.
Tomara. Porque esse combo estelar é uma das incontáveis provas de que o rock na sua forma mais pura nunca sairá de moda. Sem mencionar que, às vezes, tudo que a gente precisa é um pouco de distorção e doses cavalares de feeling. Exatamente o que Liam Gallagher John Squire proporciona.
Ouça na íntegra a seguir.