O que esperar de um grupo pop macedônio com raízes fincadas na cenário punk DIY?
Por Luiz Athayde
O ponto em comum entre o homem e a banda centrada na vocalista Kristina Gorovska e nos multi-instrumentistas Vasko Atanasoski e Deni Krstev, certamente está na mescla de ideias e influências para gerar algo único. Edward Bernays, pai das relações públicas e da propaganda, ao fundir Gustave Le Bom e Wilfred Trotter; e os macedônios do Bernays Propaganda, com seu background DIY (“faça você mesmo”), voltado para inúmeras esferas musicais.
Vtora mladost, treta svetska vojna é o sétimo lançamento destes eslavos de Escópia, capital da Macedônia. Suas profundas raízes na cena hardcore da região só poderiam desbancar em duas vias: um registro pesadíssimo e cheio de raiva, ou algo completamente diferente. Para não dizer sofisticado, beirando a perfeição, como é o caso deste disco.
Vale enfatizar que a posição geográfica do país (Macedônia Antiga, ou ainda, Macedônia do Norte) e seu vasto contexto histórico – reinados, guerras, fortes vínculos com a Grécia Antiga, etc – (felizmente) interferiu na sonoridade diversificada do grupo, contribuindo para carimbar sua marca na cena indie? Pós-punk? New Wave? Synthpop com doses homeopáticas de música étnica? Sabe-se lá. Ainda bem.
Curiosamente, essa salada étnica, que inclui naturalmente o norte da África (de fato, é logo ali, só ver no mapa) é percebida logo na primeira faixa “Retki bilki”, que na verdade lembraria qualquer atual nome indie/mpb se a letra fosse em português. Ou a percussiva “Dojde život”, dona de uma beleza ímpar.
Já “Ne sme fini eden so drug” é a resposta oriental ao Depeche Mode, enquanto “Mojata Marija” traz aquela porção básica de contemporaneidade para equilibrar o álbum. Quase chill, “Vežbaat država” ataca novamente de synthpop em meio aos trechos em spoken word de Kristina.
“NATO vleguva vo Skopj” conta com o rapper local Volk Makedonski, e mesmo lançando mão de rimas, a pegada local fala mais alto, inclusive pelo seu clima de manifesto. “Ḱerka na gladot” chega surpreendendo com seu início tipicamente punk. No entanto, o que se segue é um mega groove de dotes orientais capitaneado pela doce voz de Gorovska, aqui com um efeito dobrado.
Perto do fim, “Ništo nema da nè razdeli” abre espaço para duas participações de peso: Mike Watt, do esquisito fIREHOSE (sim, com “f” mesmo ), e o guitarrista de jazz Toni Kitanovski, em uma das ambientações mais regionais do álbum. A percussão mais uma vez dá um tiro certeiro.
Por último e talvez o mais importante, “Zloben fank”, contando com a participação do produtor Stojche. Imagine um cruzamento entre New Order e Afrika Bambaataa no oriente. E mais: se houvesse uma aposta para manter a pista cheia em uma festa alternativa, essa seria a faixa com valores mais altos. Valendo.
Embora dançante de um jeito extremamente envolvente, a temática nunca foi tão punk: tudo girando em torno de observações políticas, direitos humanos e desobediência civil. O título já sugere: “2ª Juventude, 3ª Guerra Mundial”, em português.
Talvez se cantassem em inglês o Bernays Propaganda poderia ter uma maior projeção além do circuito do eslavo – shows recentes incluíram países como Sérvia, Croácia, Hungria e o quintal de casa. Só que aí perderiam um dos componentes mais importantes e atrativos de sua identidade: a honestidade.
No mais, candidato a clássico, e que poderia muito bem figurar o Você Precisa Ouvir, mesmo sendo da classe de 2019.
Ouça Vtora mladost, treta svetska vojna:
Pingback: My Tear – Кога не се сакаме - Class of Sounds