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Hackedepicciotto – The Current

Baixista do Einstürzende Neubauten traz novo resultado de sua parceria com Danielle de Picciotto

Por Luiz Athayde

Hiato discográfico no Einstürzende Neubauten não significa necessariamente, pausa de seus integrantes. Mesmo sem lançarem álbuns desde Lament, de 2014, o grupo germânico se manteve ativo em outros estúdios, com outras vibrações sônicas.

Um dos trabalhos mais notórios foi a parceria do vocalista Blixa Bargeld, com o músico italiano Teho Teardo, do qual registrou, em 2016 o álbum Neríssimo; o terceiro de quatro discos.

Sob luzes mais diminutas, mas não menos importantes, encontra-se na classe de 2020 o novo petardo experimental do baixista Alexander Hacke, juntamente com Daniele de Picciotto; musicista e cineasta nascida em Washington, EUA.

Sob a alcunha Hackedepicciotto, o casal acabou de soltar seu quarto registro, The Current. Com produção carimbada por Hacke, o disco foi gravado nos estúdios Studio 65, em Berlim e Blackpool, no Reino Unido, as músicas, de um modo geral, trazem parte do background de Hacke em seu grupo principal, mas com a nítida e esperada adição da sensibilidade de Picciotto.

Danielle de Picciotto e Alexander Hacke (Foto: Kristýna Šaarová/Full Moon Magazine)

Sons percussivos, experimentos eletrônicos e um sentimento rítmico talvez não possível em trabalhos do Neubauten, The Current começa envolvendo já na sugestiva faixa de abertura “Defiance” (“Desafio”, em português), em um mote desafiador, carregado de suspense, e ao mesmo tempo convidando o ouvinte a seguir em frente.

“Owards” é essencialmente envolto a vocais com toques clássicos e o distorcido baixo de Hacke, em um quase interminável crescendo de gelar a espinha.

Longe de remeter ao gosto musical de Hacke – o músico é um grande fã de black metal –, “Metal Hell” entra mesmo é no submundo intricado e sem rumo da música eletrônica, em uma das faixas mais antagônicas do disco.

Logo na sequência vem a faixa título, em claras referências sônicas à música oriental de regiões como a Mongólia. Nesta, o enfoque é na soturna voz de Hacke, dando um tom sombrio e, ao mesmo tempo, com cara de desfecho de filme.

Na verdade, é essa a sensação em boa parte do álbum; de que estamos diante de uma trilha sonora de um drama experimental, e talvez, me arrisco a dizer, em um filme de Jean-Luc Godard.

Com uma pegada lembrando nomes como Björk, Suicide e Portishead, “Petty Silver” só não leva a voz de Danielle para vários momentos radiofônicos por conta da aparente aura descompromissada da música.

Já em “The Banishing”, o espírito que parece “baixar” é o do compositor japonês Kenji Kawai, especialmente em seu trabalho no live action de Ghost in the Shell, de 2017. Aliás, a cultura japonesa sempre foi uma das grandes influências do Neubauten, e com Hacke não poderia ser diferente, mesmo em seus spin-offs discográficos.

No mais próximo que podemos chamar de krautrock “Third From The Sun” continua o flerte com um futuro distante – ou nem tanto assim –, com doses cavalares de percussão. Um dos picos do álbum, diga-se.

Se um dos grandes trunfos culturais da Alemanha é a música eletrônica, do lado de quem é (ou bebe a água) de Washington, um dos fortes é a naturalidade para compor peças spoken word – Henry Rollins que o diga –, e em “Loreley”, a mais curta do disco, Picciotto solta suas palavras quase como um interlúdio.

Caminhando para o fim, “The Seventh Day”. Escolhida para a produção videoclíptica assinada por Helio León, a faixa possui mais apelo visual do que comercial; cortesia das vozes etéreas ao longo dos seus 6 minutos.

“Upon Departure” seria o fechamento perfeito tanto para um filme quanto para um álbum como este, se não fosse o modo não convencional de registros como esse de fechar as portas. De Picciotto e Blixa Bargeld protagonizam um verdadeiro spoken word sci-fi em “The Black Pool”.

Não à toa, Hacke se refere à The Current como um “drone cinematográfico”, com a máxima de fazer todos se “distanciarem da depressão e da desesperança”.

The Current não é bem uma ciência exata no que diz respeito a trazer alegrias quando é tocado, mas que estamos diante de algo fora do tradicional, e ainda assim, com elementos extremamente agradáveis aos ouvidos, é verdade.

Aos que anseiam em um nível patológico pelo novo álbum do Neubauten,  recomendo se acomodarem em uma sala de espera de cores frias ao som deste Compact Disc, que é um dos mais interessantes da classe de 2020.

Ouça The Current no:
Spotify: https://open.spotify.com/playlist/2Hp53QT1DX0m9MVwdXpfBk
Bandcamp: https://hackedepicciotto.bandcamp.com/album/the-current

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