Abuso de álcool, crise dos 30 e descontração em estúdio marcaram o clássico álbum da banda
Por Luiz Athayde
Em 1989 nem o céu era o limite para o The Cure. Após o mega sucesso obtido com Kiss Me Kiss Me Kiss Me (1987), com direito a estreia em terras brasileiras, o grupo britânico de Crawley se preparava para editar sua obra prima.
Disintegration saiu em algum momento deste exato dia daquele ano, sob a chancela do carimbo Fiction Records. A produção contou com as mãos do guitarrista, vocalista, compositor e líder Robert Smith, juntamente com David M. Allen, velho conhecido da banda e de falanges do pós-punk.
Constantemente (e naturalmente) associado ao gótico, o álbum foi a volta de um mergulho mais profundo nessa atmosfera, entrelaçada a doses de melancolia, mas sobretudo pop.
Mas o processo criativo que levou ao clássico registro não foi tão simples; Smith se encontrava na “crise dos 30”, movida especialmente por sentir que todas as obras-primas do rock haviam sido feitas antes dos membros das bandas completarem essa idade.
As gravações ocorreram entre novembro de 1988 e fevereiro de 1989, no Hookend Recording Studios, Oxfordshire, Inglaterra, e o clima entre o multi-instrumentista e integrante original, Lol Tolhurst e o restante do grupo andavam mais que tensas; Tolhust estava imerso no abuso de álcool e reclamava continuamente do caminho que o álbum tomava, especificamente em relação a mixagem. Não deu outra: despedido.
Por outro lado, o ambiente após a saída de Tolhust não sofreu alterações, com o clima nas gravações seguindo de forma descontraída, como relembrou o tecladista Roger O’Donnell em 2009:
“Me lembro claramente de rir, brincar e zoar na sala de controle enquanto Robert estava cantando ‘Disintegration’, e então todos nós tentamos ficar sérios quando ele veio ouvir. […] Nunca houve uma atmosfera séria no estúdio, e quando você pensa sobre o álbum e como ele é dark, eu tenho certeza de que as pessoas acham que estávamos sentados cortando nossos pulsos com velas e correntes penduradas nas paredes.”
Dois singles anteciparam o lançamento do disco: a radiofônica “Lullaby” (10/04/1989) e a urbaníssima “Fascination Street” (18/04/1989). Os subsequentes foram, “Lovesong” (21/08/1989) e a até hoje cadeira cativa das apresentações ao vivo da banda, “Pictures of You” (19/03/1990).
Foi um registro marcado por uma série de efeitos, dos mais visíveis aos sutis, como as fitas rodadas ao contrário em “Prayers for Rain”, definindo o seu ritmo lento e dramático.
A recepção foi boa entre público e crítica, apesar de algumas ressalvas. Em resenha recente da Rolling Stone, Michael Azerrad escreveu:
“Embora Disintegration não abra novos caminhos para a banda, ele refine com sucesso o que o Cure faz melhor. […] Apesar do título, Disintegration se une lindamente, criando e sustentando um clima de melancolia completamente absorvida. Se, como Smith sugeriu, o próprio Cure está prestes a se desintegrar, esse é um somatório digno”.
O escritor Mat Snow não fez diferente: “O Cure estudou bem a arte da trágica linha de baixo, o lampejo hesitante e melancólico da guitarra, a coloração fúnebre do teclado”, concluindo: “Disintegration é, portanto, bem trabalhado, […] apenas não me diga que é original.”
A massiva The Prayer Tour começou logo após o lançamento do disco, com apresentações em estádios ao redor do mundo. Nos Estados Unidos, onde a banda já regozijava de estrondoso sucesso, contaram com Pixies, Shelleyan Orphan e Love and Rockets como atos de abertura no Giant Stadium, em Nova Jersey.
Nas paradas: 4º lugar na Suíça, 3º no Reino Unido, França e Países Baixos; 2ª posição na Alemanha e número 12 na Billboard 200 (EUA); disco de ouro na França (duas vezes), Alemanha, Itália, Nova Zelândia, Suíça e Reino Unido e duas vezes disco de platina nos Estados Unidos.
Lançamento mundial em CD, LP e Cassete incluindo o Brasil pelo carimbo Polydor em 1989. Em 2010 Disintegration ganhou uma caprichada edição deluxe em CD triplo, contendo o álbum original no disco 1, demos e outras raridades no disco 2 e Entreat; o famoso ao vivo em Wembley, de 1989. E ainda teve o Alternative Rarities 1988-1989, com faixas ao vivo e demos instrumentais, exclusivamente no formato digital.
Na classe de 1989 o The Cure era: Robert Smith (vocais, guitarras, teclados, produção), Simon Gallup (baixo, teclados), Porl Thompson (guitarras), Roger O’ Donnell (teclados), Boris Williams e Lol Tolhust (creditado como “outro instrumento”).