Duo germânico começa pelas sombras em um universo dominado pelos sintetizadores
Por Luiz Athayde
Alemanha e música eletrônica. Quando em uma mesma frase, você já sabe que se trata de pleonasmo. No entanto, há nomes que te pegam nas primeiras notas… ou em algum lugar na escuridão. Caso do instigante duo Caput Medusae.
Seu álbum de estreia se chama You Can’t Negotiate With Zombies e saiu agorinha por carimbo próprio, independente. Ele figura o cartão de visitas de uma trajetória iniciada em setembro de 2019, com o single “Angerona”; algo como uma ode ao minimal synth.
Todavia, seguir uma linha sônica nunca esteve nos planos de Tina Mar (baixo, voz) e Stefan Scott (voz, teclados, bateria). Na verdade, o registro é apenas um meio de explorar suas variadas influências; do darkwave a proximidades maiores com o pop.
O resultado é tão heterogêneo que ficou empolgante. Mesmo. “Überfan” dá a largada à la She Past Away, como se fosse uma forma de cooptar góticos para sua seara. Coisa que acaba sendo bem-sucedida em “On My Trip”, com sua pegada disco.
Ainda no lado A, “Eerie Dance” apela por uma via melancólica, movida a generosas linhas de baixo protagonizada pelos teclados. Das músicas mais melódicas do disco.
Todo álbum que se preze tem sua música de trabalho, e “I Wear Black ‘Til I’m Dead” cumpre esse papel maravilhosamente bem. Quanto ao som, não há o que divagar: é Depeche Mode encontrando Kraftwerk em alguma esquina fria de Berlim. À noite, claro.
Por outro lado, “Colder Than Ice” cairia muito bem como trilha sonora de um filme policial retrofuturista e noir. Synth até a medula, sensacional como a faixa anterior.
Agora, o que seria do pós-punk sem o baixo (de verdade)? É esse instrumento que toma a frente na “Slave To The System”, aliada a uma batida lo-fi e o sotaque forte de Stefan ao cantar o refrão. A faixa-título surge logo na sequência para fazer a linha synthpop.
Ela lembra o que seus compatriotas fizeram nos anos 90, porém, com o adicional e surpreendente viés industrial/punk. Os primeiros nomes a surgirem na mente são Skinny Puppy e Diabolos Rising, embora (dizer isso) soe tão vago quanto querer empatar sua abrangência.
Por falar em referências, é até curioso eu não ter citado The Cure. Ultimamente, não tem cabido no gibi o tanto de gente expondo suas influências de Robert Smith e cia. Algo perceptível na faixa que fecha o registro, “Endboss”.
Os bons ventos trazem ecos de Faith (1981) e Pornography (1982). Ao menos até surgir um simulacro de Wang Chung do longa To Live and Die in L.A. (1985). Fica a dica se houver algum remake.
Álbum curto, é verdade. Contudo, digno de replay; é o jeito punk, alemão de dar o recado. Mas também de garantir que irá tomar a atenção do ouvinte. E por aqui conseguiu sem o menor esforço.
Ainda:
+ A capa de You Can’t Negotiate With Zombies foi extraída da série de pinturas ‘Vermelho – Espaço para Manobra’, de 2005/2006, da artista alemã Brigitte Waldach.
+ Caput Medusae (ou “cabeça da medusa”) é uma doença onde seu principal sintoma é o aparecimento de terríveis veias grandes e visíveis ao redor do abdômen. E também uma planta com flor da família das bromélias.