Um dos maiores clássicos do dreampop
Por Luiz Athayde
Neste dia, na classe de 1990, os escoceses do Cocteau Twins lançavam um dos álbuns mais queridos do cenário alternativo, e o último pelo seminal carimbo 4AD.
Heaven or Las Vegas teve produção assinada pela própria banda. No entanto, o processo até a geração do álbum envolveu prioridades familiares, como o casamento do baixista Simon Raymonde e a gravidez de Elizabeth Fraser, esperando seu primeiro filho com o guitarrista Robin Guthrie. Mas, principalmente, percalços gerados pelo vício de Guthrie em cocaína. A situação estava tão caótica que o casal temia que a criança nascesse viciada.
Sem mencionar as paranoias e oscilações de humor do guitarrista, causando profunda tensão durante o processo criativo, bem como a relação com Fraser. Foi nesse clima que o álbum foi ganhando vida, e também naquele período que a cantora teve um momento de “claridade”.
“De repente, tive uma confiança como nunca em minha vida, que perdi depois que tive o bebê, porque é uma experiência muito assustadora. Você a perde novamente e precisa começar de novo. Mas isso te transforma”, disse Fraser.
Já Simon Raymonde foi mais amplo:
“Foi uma época realmente estranha; enquanto a música era incrível e muito divertida de fazer parte, juntos Robin e eu compusemos algumas de nossas melhores músicas e, separadamente também, ele escreveu algumas por conta própria e eu fiz algumas, e quando ele adicionou coisas para o que eu havia escrito, as tornou melhores e vice-versa.”
Ele acrescenta: “Estávamos em um espaço muito bom musicalmente, mas dedicando tanto tempo e esforço à música que tentávamos mascarar todas as outras coisas que estavam acontecendo que não queríamos parar e pensar por muito tempo. Mas o problema das drogas ficou totalmente fora de controle no final das gravações de Heaven ou Las Vegas, e isso obviamente levou ao período de reabilitação em que nos mudamos logo depois.”
Para desenhar a poderosa música, uma capa à altura. De acordo com Guthrie, o grupo quis capturar o etéreo. Para isso, fotografaram uma árvore de natal em longa exposição, causando o belo efeito na foto; o que também não deixa de ser um desenho do estado de espírito do grupo na virada para a década de noventa. Raymonde revelou:
“Meu pai [o músico britânico Ivor Raymonde] morreu durante a gravação do disco. Eu tinha apenas 27 anos, ainda era novo. Ele foi um cara muito influente pra mim. Acho que ter um evento pesado na vida ajudou a fazer um álbum tão produtivo.”
E continua: “Tivemos ‘Pitch the Baby’, uma canção de alegria sobre a chegada de um bebê, e também ‘Frou-Frou Foxes in Midsummer Fires’, que é uma faixa miserável, mas que Liz transformou em uma coisa linda com sua letra. É uma canção melancólica, que compus no piano depois de um ou dois dias que meu pai havia partido.”
Ainda comentando sobre o trabalho, Raymonde se mostra num dilema sobre qual é seu álbum favorito:
“É um disco que tem altos e baixos, e é por isso que ele funciona com dez músicas, tem luz e escuridão. Acho que é um grande disco. Olhando pra trás, depois de tantos e tantos anos, são meus dois álbuns favoritos. Se hoje ‘Heaven or Las Vegas’ é meu predileto, amanhã escolho ‘Blue Bell Knoll’.”
Do registro saíram os singles “Iceblink Luck” (27/08/1990) e “Heaven or Las Vegas” (outubro de 1990), e suas melhores posições foram 7º lugar na parada britânica e número 99 no Billoard 200, dos Estados Unidos.
Também vale mencionar que o mesmo foi incluído no livro 1001 Álbuns Que Você Precisa Ouvir Antes de Morrer. E por votação, figurou a 218ª posição na terceira edição da All Time Top 100 Albums, de Colin Larkin.
Mais que um álbum, Heaven or Las Vegas ajudou a moldar as camadas subterrâneas da música pop/alternativa. Na verdade, o mesmo traçou novas pinturas para uma estrada existente, mas que necessitava de uma nova pavimentação, deixando sua marca no vasto leque midiático do pós-punk, ethereal wave, ambient pop e afins.