Simplesmente as oito melhores contraindicações de Robert Smith e cia em muitos, muitos anos
Por Luiz Athayde
Todo o hype em cima de Songs of a Lost World, novo álbum do The Cure em 16 anos, já era mais que esperado. Dada a história da banda e do histórico de seu líder, o guitarrista e vocalista Robert Smith, de não apressar tanto as coisas.
Contudo, como qualquer barulho em torno de um lançamento, há o perigo de possíveis defeitos ficarem escondidos, graças ao fervor dos fãs xiitas e da imprensa empolgada.
Só que de forma surpreendente ou não, este é um caso que está longe de passar por tais características. Smith realmente se preocupou em criar um registro à altura de seu catálogo, especialmente quando (inevitavelmente) comparado ao seminal Disintegration (1989).
Ele teria que ser intenso; triste, dramático, profundamente emocional. E bem, é.
Quem acompanhou as postagens misteriosas do grupo nas redes sociais (e também no site criado exclusivamente para o lançamento do disco) conferiu uns mini aperitivos. Além dos singles, que deram a deixa do teor que estava por vir.
“Alone” foi o cartão de visitas com cara de déjà-vu. É o Cure de volta à classe de 1989, porém, trazendo uma atmosfera de aprisionamento; tanto pelo se sentir sozinho, quanto pela melodia flutuante, de sequestrar o ouvinte nos primeiros segundos.
Na verdade, trata-se de uma constante, tendo em vista que seu forte está em criar climas dentro de uma canção pop. Como nas orquestrações em “And Nothing Is Forever”, a mais com cara de trilha sonora e, nada diferente da faixa anterior, envolvente do começo ao fim.
Em “A Fragile Thing”, o aceno aos anos 80 é tão sinuoso quanto a cozinha, guiada pelo baixista Simon Gallup e o baterista Jason Cooper. No entanto, a linha temporal pode ser compreendida entre os álbuns The Top (1984) e novamente, “Kiss Me…”.
Gallup mantém as rédeas (com distorção, diga-se) juntamente com o guitarrista Reeves Gabrels na estrondosa “Warsong”, detonada pela bomba de teclados de Roger O’Donnell. Mas aí surge “Drone: Nodrone” para, digamos, levantar os ânimos. Fantástica define a levada cheia de groove, que também é uma das características marcantes da formação inglesa. Cortesia dos ecos de Wish (1992), mas sem deixar muito na cara.
Por volta de 2019, Smith havia revelado o quanto a morte da mãe, do pai e do irmão influenciou Songs of a Lost World. Especificamente, “I Can Never Say Goodbye”, onde o músico expõe de forma simplificada a sua dor, inclusive se reconectando com o mesmo tempo chuvoso de “The Same Deep Water As You”.
“I can’t wake this dreamless sleep however hard I try / I’m down on my knees, empty inside”
(“Não consigo acordar desse sono sem sonhos, por mais que eu tente / Estou de joelhos, vazio por dentro” – trecho devastador para quem também perdeu um ente querido.)
Não que a faixa seguinte, “All I Ever Am”, melhore, mas ao menos musicalmente ela se mostra mais radiofônica. Ou, The Cure clássico, com o autor cantando sobre desesperança.
Esse sentimento, no entanto, é profundamente explorado no longo encerramento, “Endsong”. O que antes era perda, agora é sobre o que sobrou: nada além da velhice – “Sem esperanças, sem sonhos, sem mundo”. Musicalmente, é viagem garantida. Boa ou ruim.
Mais que isso, Songs of the Lost World denota algo curioso: será que se essas mesmas músicas tivessem sido lançadas no odiado Bloodflowers – não por este, que o tem como disco de cabeceira –, de 2000, o frisson seria o mesmo?
Há vários momentos onde o play daquele ano faz um cruzamento “sem proteção” com Pornography (1982). A diferença está apenas na duração de algumas composições, um tanto curtas.
De qualquer maneira, o mais importante aqui é avisar que se trata das melhores oito contraindicações do lote de 2024. Está longe curar, ok, mas pior do que está, não fica: neste mundo perdido, qualquer música boa já serve de alento – ainda que através do gótico.
Ouça na íntegra via Bandcamp, ou a seguir.