Artista americana solidifica sua sonoridade com o corpo ficado nos anos 80, e os olhos no futuro
Por Luiz Athayde
Frankie Rose está de volta com seu primeiro álbum em seis anos. No mercado discográfico, isso parece muita coisa. E é. Para ela, tudo a seu tempo; talvez a palavra-chave em Love As Projection, recém-saído via Slumberland Records.
Seu nome é para lá de conhecido no subterrâneo independente, seja outrora em atividades paralelas com o Beverly, Crystal Stilts, Dum Dum Girls ou Vivian Girls. Além de se lançar como Frankie Rose and the Outs ao editar um disco homônimo. Todavia, sua estreia digamos, puramente solo, veio com Interstellar (2012); sem trocadilhos piegas, o céu era realmente o limite.
Nos lançamentos subsequentes, o prisma sempre foi a alternância de indie, pós-punk, dream pop e ethereal wave, com destaque para Cage Tropical, de 2017. E ainda deu tempo de editar um registro de covers no mínimo diferente: o clássico Seventeen Seconds, do Cure. Na íntegra.
De lá para cá, shows, mais shows e um sopro de vida durante a pandemia do Covid-19 – leia-se: o single “I’ll Be Your Lightning” saindo em 2021. No entanto, parecia que tudo isso seria apenas um ensaio para seu apogeu criativo.
Frankie voltou mais inspirada do que nunca, em uma espécie de imersão não exatamente nas abordagens que lhe deram reconhecimento, mas na década que de alguma maneira lhe deu norte. Claro, a de 80.
E a parcial foram 10 canções superlativas no que dizem respeito ao poder de envolver o ouvinte nos detalhes. Logo na abertura, o single “Sixteen Ways” e seu climão synth aliado ao peso da bateria e claro, vocais etéreos de Rose. Em “Anything”, o mergulho foi ainda mais profundo no passado, em especial nos longas de colegial dos anos 80. “É como uma daquelas cenas de baile dos filmes de John Hughes”, explicou ela.
E continua: “É uma canção esperançosa sobre o abandono do medo, mesmo que o mundo esteja literalmente em chamas. No final, pelo menos nós nos temos um ao outro.” Esta música soa ainda melhor após assistir filmes como Gatinhas & Gatões (Sixteen Candles, 1984) e A Garota de Rosa-Shocking (Pretty in Pink, 1986).
Na sequência, “Had It Wrong” revela seu apreço pelo pop contemporâneo, que já há alguns anos vem sendo expressado de forma mais atmosférica, climática. Vide nomes como Jonna Lee e Shura; esta em especial por seu fantástico álbum de estreia, Nothing’s Real (2016).
E por falar em atmosfera, “Saltwater Girl” é o tipo de composição que se caso fosse dominada por guitarras distorcidas, ainda assim seria uma bela canção, mas shoegazer. Percebe-se ecos distantes de Slowdive, embora não seja sua intenção.
“Feel Light” é outra com as mãos de Rose na atualidade. A mesma é quase uma espécie de interlúdio guiado por camadas de teclado e vozes dobradas, resultando naquele delicioso ar ethereal wave. Nos primeiros segundos de “DOA”, logo achei que viria algo influenciado por Robert Smith. Ledo engano, e dos bons: Enya encontra Madonna na primeira temporada da série Miami Vice.
A pegada new wave reaparece na “Sleeping Night And Day”. Na verdade, esta tem cheiro de single com seu potencial radiofônico e principalmente videoclíptico. Pop até a medula, com refrão antes de chegar ao primeiro minuto. Hit pronto.
Por outro lado, ainda bem que não me obrigo a sinalizar o ponto alto de um álbum. Mas, se fosse necessário, “Molotov in Stereo” seria candidata com facilidade. Novamente a atmosfera new age permeia por aqui, construída como uma balada cativante e que certamente irá te fazer viajar para longe. Melodia fantástica em meio a delays e contratempos.
A hora e a vez dos sintetizadores, mas sobretudo das pistas de dança está em “Come Back”. Essa quase destoa em relação as outras faixas, embora também configure pontos altos no gráfico imaginário do disco. Já o encerramento acontece de maneira mais ambient possível com “Song For A Horse”.
Sem sombra de dúvidas, Love As Projection é nada menos que Frankie Rose em seu melhor. Os anos – e os álbuns lançados – provaram que sua marca sonora já estava estabelecida. Algo raro há bastante tempo. Mas nem isso a impediu de se refinar para dar um passo adiante como artista independente.
Melhor do ano? Bom, a gente trabalha com indicações, e não necessariamente com competições. Mas este álbum vai além: audição obrigatória.
Ouça na íntegra pelo Bandcamp ou abaixo no Spotify.
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